quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Vírgula pela fechadura

Análise mais detida do sinal de pontuação mostra como é primária a noção de que ele serve só para marcar pausas

Josué Machado

Em muitos textos, a má colocação de vírgulas pode gerar duplo sentido e alterar o significado do que se queria dizer. Há casos até em que a má virgulação resulta em significado oposto ao pretendido.

Em parte por isso, deve-se esquecer a noção algo primária de que a vírgula serve apenas para marcar pausas. Porque, com essa noção, se o escriba estiver com soluço ou tiver tendência ao balbuceio e à tartamudez, também conhecida como gagueira, estará inclinado a usar vírgulas a mancheias. O que não ficará bem. A vírgula serve, sim, para marcar pausas, mas relaciona-se, sobretudo, com o modo como se distribuem os componentes da oração. O que explica, por exemplo, que construções como "Sim, senhor." e "Não, senhor." sejam marcadas na escrita por vírgulas que não correspondem a pausas reais na fala, como aponta Celso Cunha em sua Gramática da Língua Portuguesa (Fename, 1982).

Portanto, em caso de dúvida, melhor seguir um conselho que causará arrepios a muitos sábios: não se usa vírgula. Menos mal a vírgula esquecida do que a abundosa. Salvo se sua falta for catastrófica, desastre algo raro.

Proibição 1
Jamais se separa por vírgula o sujeito (em itálico nos exemplos abaixo) do predicado verbal, mesmo que o núcleo, modificado por adjuntos, esteja distante do verbo

Para descobrir o sujeito pergunta-se ao verbo: o que ou quem.

Ex.:O consultório daquele cirurgião plástico açougueiro no extremo oposto de minha rua foi fechado pela polícia.

1. O que foi fechado? Sujeito: o consultório (núcleo do sujeito).

Ex.:O padre procurado pela justiça e o filho dele mantinham a igreja caça-níqueis em funcionamento.

2. Quem mantinha a igreja caça-níqueis? Sujeito: o padre e o filhote (sujeito composto por dois núcleos).

Ex.:Muito melhor do que cassar aquele político seria forçá-lo a devolver o dobro do que afanou.

3. O que seria melhor do que cassá-lo? Sujeito: forçá-lo a devolver a bufunfa em dobro.

Proibição 2
A vírgula jamais deve separar o verbo de seus complementos em itálico)
- O Luís come empadinhas engorduradas (compl.) todos os dias.
- O Edgar gostou muito daquela garota robusta. (compl.)
- Elas responderam a eles (compl.) que não voltariam (compl.)
- À mulher e aos filhos (compl.) ele disse que não voltaria mais (compl.).
- Deu aos senadores (compl.) a garantia de que não os denunciaria (compl.).

Com aposto
Usa-se vírgula com aposto explicativo (em itálico). O aposto explica ou especifica um termo da frase. Pode ser nome próprio ou não; quando explicativo, é seguido de vírgula se começar a frase; no meio do texto, vem entre vírgulas.

- Aposto explicativo (grifado): Grande poeta popular, Vinícius deixou obra extensa. Tímido e introvertido, Luiz Fernando Verissimo escreve com leveza e bom humor. Luciano Pavarotti, grande tenor italiano, morreu em 2007.
- O aposto especificativo (grifado) rejeita vírgulas: O presidente Lula apoiou o pacote; Avenida São João; Rua Breves.

Ao interromper
Usa-se virgula em interrupções de frase, intercalações ou termos explicativos (em itálico)
- Ela, muito surpresa, concordou com ele.
- A decisão do Senado, supõe-se, será uma glória.
- Aquele senador, um cadáver político, usará todos os recursos, até inimagináveis, para se salvar.

Com Vocativo
Usa-se vírgula com vocativo. O vocativo é uma interpelação ou chamado da pessoa com quem se fala. Aparece no início, no meio ou no fim da frase, sempre separado por vírgulas, às vezes precedido de "ó" (em itálico):
- Deus meu, por que me abandonaste?
- "Ó Fulô, ó Fulô, / Vem me ajudar, ó Fulô / Vem abanar meu corpo / Que eu estou suada, Fulô!" (de Essa Nega Fulô, de Jorge de Lima.)

Com a conjunção E
A conjunção e raramente é antecedida de vírgula porque em geral une idéias; é necessária quando liga orações com sujeitos diferentes (em itálico):
- Ela falou sem parar por muito tempo, e eles ficaram ouvindo desanimados. ?
- A loja distribuiu roupas, sapatos, jóias, e o resto ? será doado a instituições de caridade.

De jornais:
- "Tenho rendimento tributável exclusivamente na fonte e minha mulher, renda do trabalho assalariado."
- "O jornal publicará a carta de protesto e a repórter incompetente que escreveu a reportagem com erros dará a última palavra."

Falta a vírgula antes do "e" nos dois casos. Deveria ser, portanto:
- "Tenho rendimento tributável exclusivamente na fonte, (vírgula) e minha mulher, renda do trabalho assalariado."
- "O jornal publicará a carta de protesto, (vírgula) e a repórter incompetente que escreveu a reportagem com erros dará a última palavra."

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Ensinar com Atividade Lúdica

Aprendendo com as charges





O objetivo dessa atividade é exercitar a leitura da charge e sua contextualização. Para seu desenvolvimento sugere-se os seguintes passos: Selecionar uma charge atual que retrate uma situação polêmica; Pedir que os educandos verbalizem o que compreendem da charge em questão e para que procurem matérias no jornal que abordem o mesmo assunto tratado na charge. Com base nas informações extraídas das matérias, juntamente com a leitura da charge, deve-se debater os valores sociais que as charges carregam, analisando a opinião nela expressa, e posicionando-se frente a essa opinião. A partir do debate outras atividades podem ser geradas. Desde novas charges a textos produzidos por eles. Atividade sugerida pelo Programa O POVO na Educação, do Jornal O POVO, de Fortaleza/CE.

Hora da lição de casa

Cada vez mais, empresas que investem na área social, em especial na educação, se dão conta de que é preciso avaliar a efetividade das ações e apostar na organicidade, mais do que no marketing

Paulo de Camargo

Quem chega à escola estadual José Leite Lopes, no bairro de classe média da Tijuca, no Rio de Janeiro, não faz idéia do cenário que encontrará: exposições multimídia de videogames, salas-ambiente computadorizadas, aulas que mesclam a produção de roteiros para audiovisuais ao desenvolvimento de conteúdos curriculares, conexões sem fio, enfim, um verdadeiro laboratório onde 600 jovens têm a disposição recursos tecnológicos entre os mais modernos de que se pode dispor.

O projeto, denominado Núcleo Avançado em Educação (Nave), é fruto de uma parceria entre o Instituto Oi Futuro e a Secretaria Estadual da Educação do Rio de Janeiro. Envolve universidades, como a PUC-RJ, organizações não-governamentais reconhecidas e educadores de renome como Antônio Carlos Gomes da Costa, um dos formuladores do Estatuto da Criança e do Adolescente, e está longe de ser uma aventura onde se gasta muito dinheiro em pirotecnia tecnológica, apenas para se colher notícias na imprensa.Trata-se de um bom exemplo de amadurecimento dos investimentos empresariais em projetos de cunho social e embute uma boa notícia para a educação brasileira: as elites empresariais começam a direcionar seu poder de fogo para ajudar a tirar o Brasil da rabeira mundial da educação, pressionando governos, estabelecendo parcerias com o poder público, financiando iniciativas do terceiro setor e desenvolvendo projetos próprios.

Os números comprovam a tese. Conforme o estudo Ação Social das Empresas, publicado em 2006 pela pesquisadora Anna Peliano, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), 600 mil empresas brasileiras investiram, em 2004, cerca de R$ 5,3 bilhões em programas sociais (valores monetariamente atualizados em 2007).

Desse total, estima-se que ao menos R$ 2 bilhões anuais venham sendo aplicados em projetos na área da educação. Um volume de recursos crescente e superior ao investimento realizado na área por muitos estados brasileiros, que vem sendo injetado em projetos de alfabetização, formação de professores, difusão de novas tecnologias, enfim, em áreas estratégicas para o ensino.

A tendência é de forte crescimento. O estudo do Ipea indicou ainda que 43% das empresas planejavam investir mais recursos em programas sociais. "A participação das empresas na área das políticas sociais vêm crescendo muito. Temos observado também nos debates e nas agendas o aumento da importância dessa parceria. Para isso, é preciso saber quem é o parceiro", explica a pesquisadora Anna Peliano.

Hoje, já estão em curso projetos que mostram amadurecimento, especialmente aqueles que se baseiam na parceria com o poder público, visando a multiplicação da escala dos recursos investidos.

Um bom exemplo desse novo enfoque é o Programa de Educação Afetivo-sexual: um novo olhar, iniciativa da Fundação ArcelorMittal Brasil, que tem o objetivo de oferecer educação preventiva no campo da sexualidade e da saúde reprodutiva, nos municípios que ficam no entorno das unidades de produção das empresas do grupo.

O programa, iniciado em 2000, envolveu 20 escolas públicas de cinco municípios. Hoje já são 118 escolas em dez municípios de três estados: Minas Gerais, São Paulo e Bahia. Em nove desses municípios, o programa foi incorporado à política municipal de ensino. Foram capacitados mais de 1500 educadores e profissionais da saúde para a ação que, segundo a empresa, já chegou a pelo menos 73 mil adolescentes.

Tão importante quanto o trabalho realizado é a forma de integração com o poder público. Isso também marcou a iniciativa da OI Futuro, no Rio de Janeiro. A escola onde foi implantado o projeto Nav é municipal, e funciona dentro da legislação, com todos os professores da rede. A Oi Futuro investiu em tecnologia e no projeto pedagógico que o sustenta. Por fim, cada uma das oficinas realizadas é mantida por uma entidade diferente - entre ONGs e grupos de pesquisa. O projeto é acompanhado por uma equipe de avaliação externa.

As iniciativas amadurecem, e a mais recente tendência do segmento empresarial mais organizado é propor formas de alinhamento dos programas. Nesse sentido, um grupo de empresários recebeu em São Paulo, no final de junho, representantes do Ministério da Educação para buscar o encontro entre os projetos sociais das empresas e as metas globais do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Na ocasião, o ministro Fernando Haddad sugeriu, por exemplo, que as empresas centrassem foco em ações nos municípios com piores indicadores do Ideb e colaborassem com o esforço que o MEC anunciou para a formação de professores. O encontro foi promovido por dois dos mais representativos movimentos empresariais com foco em educação - o Todos pela Educação e o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife).

Para o presidente do Todos pela Educação, o ex-secretário Estadual da Educação de Pernambuco Mozart Neves Ramos, trata-se de um passo muito importante. "Lembro que, quando secretário, visitei escolas onde havia quatro formas diferentes de trabalhos de alfabetização, em função de projetos superpostos", lembra-se.

Ao mesmo tempo, o encontro de objetivos poderá fazer avançar a qualidade do trabalho filantrópico no Brasil, pois aqui também, como em tudo o mais no país, convivem o avanço e o retrocesso.

Assistencialismo e sustentabilidade

A primeira grande distinção que se faz nos investimentos sociais privados é se eles se voltam para questões pontuais, como organizar uma coleta de alimentos ou doação de livros - e, portanto, estão mais próximos da ação filantrópica -, ou se estão a serviço de um projeto socioeducativo, que "ensine a pescar", na conhecida versão do ensinamento confuciano.

No Brasil, ainda predominam as iniciativas assistencialistas. Segundo o estudo do Ipea, pelo menos metade delas são voltadas para a alimentação e o abastecimento. "Ainda é forte a cultura assistencialista. Os doadores financiam os 'bandaids' das questões sociais, ao focarem nos efeitos e não nas causas", afirmou Marcos Kisil, diretor presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis), em recente encontro de investidores sociais, realizado na Bahia pelo Gife.
O Gife congrega 80 associados que aplicaram, apenas em Educação, R$ 124 milhões, em 2006. Foi criado principalmente para oferecer aos associados uma forma de formação de pessoal, de socialização de experiências e de ferramentas de planejamento estratégico.

Sim, porque se engana quem pensa que as empresas transferem para a filantropia também aquilo que fazem de melhor - a gestão. Quando aplicam em projetos sociais, chega a ser um paradoxo a despreocupação da maior parte das companhias com tudo aquilo que caracteriza sua atuação no segmento privado: planejamento, avaliação, maximização da relação entre resultados e recursos investidos.

Uma tabulação especial feita por Anna Peliano, divulgada neste ano, revelou, por exemplo, que apenas 16% das 600 mil empresas que investem no social fazem avaliações documentadas dos seus projetos. "Acho que esse número ainda está superestimado, na medida em que as empresas consideram que um controle contábil pode ser avaliação", avalia a pesquisadora. Ou seja, a imensa maioria das empresas não sabe se o que foi gasto teve resultados efetivos, o que precisa ser corrigido ou até mesmo se valeu a pena.

Para o secretário geral do Gife, Fernando Rossetti, esse será um passo necessário, mas menos simples do que pode parecer. Uma das dificuldades é o grande número de variáveis envolvidas em um projeto social. É difícil isolar, por exemplo, qual o peso da influência de diferentes fatores, como o crescimento econômico, projetos públicos e das ações privadas, considera. "Há uma velha máxima, que diz: nem tudo o que é mensurável é importante, e nem tudo que é importante é mensurável", exemplifica.
Mas, para ele, a principal dificuldade reside ainda no planejamento. Afinal, só consegue avaliar bem quem fez um diagnóstico inicial preciso para possibilitar uma comparação posterior.

No mundo empresarial, já se trabalha no desenvolvimento de ferramentas técnicas na área. Uma das mais sofisticadas, na avaliação de Rossetti, é a desenvolvida pelo Itaú Social, baseada em detalhados cálculos econométricos.

Mas há críticos que vão ainda mais longe. Para o consultor John Edwin, presidente do Conselho da Organização Não-Governamental Paidéia, que atua em projetos educativos, a questão da avaliação é secundária, diante da grande dificuldade de interlocução entre empresários e agentes sociais.

"São culturas muito diferentes, e sentimos absoluta necessidade de definir quais são os pressupostos e quais os resultados finais desejados", diz. Segundo ele, é freqüente que os representantes das empresas e os educadores cheguem à mesa com visões completamente distintas sobre o problema, as necessidades e as soluções. "Depois, avalia-se o quê?", questiona. "Sem essa negociação das partes para criar um entendimento, fica difícil avaliar", conclui.
Para Rossetti, a única saída é criar pontes entre todas as partes envolvidas. São inúmeros os preconceitos, de lado a lado. "Há, por exemplo, em todo o mundo, a visão de que as empresas só visam o marketing; no Brasil, soma-se a isso um grande preconceito contra o lucro", analisa.

Para o diretor do movimento Todos pela Educação e ex-secretário da Educação do Pernanbuco, Mozart Neves Ramos, as empresas que só investem em filantropia buscando retorno de imagem tendem a perder força. Até porque, concorda Rossetti, os consumidores possuem um repertório cada vez mais elaborado e se tornam capazes de distinguir quem está fazendo só marketing e quem visa de fato a transformação social.

Na avaliação dele e de outros especialistas do setor, a conjuntura histórica contemporânea contribui para que as empresas tenham maior sensibilidade social. Segundo essa visão, há uma questão maior que envolve a própria sobrevivência das empresas. "Os empresários mais conscientes sabem que sem desenvolvimento igualitário não há futuro para ninguém", diz Mozart Neves Ramos.

Ato falho

À educação não cabe priorizar a preparação para o êxito econômico do indivíduo, mas a valorização da vida política e do bem comum

José Sérgio Fonseca de Carvalho


Um quadro-negro no qual, em letras desalinhadas, um jovem escreve: "O inssino no Brasiu è ótimo". Assim a capa da revista semanal de maior tiragem do país anunciou sua matéria sobre a má qualidade da educação brasileira. Melhor seria afirmar: apresentou um manifesto contra a "doutrinação esquerdista predominante em todo o sistema escolar privado e particular" (sic). Doutrinação alegadamente legitimada pela crença dos professores de que a finalidade maior da educação é 'a formação de cidadãos conscientes' e não 'o ensino de matérias'. Analisemos, pois, essa dicotomia e seus pressupostos.


De início, cabe ressaltar que a vinculação da educação escolar com a preparação para o exercício da cidadania não é um capricho de professores mal preparados, nem um ardil de esquerdistas. Trata-se de princípio constitucional, reafirmado no artigo 2º da LDB. Esses diplomas legais, por sua vez, refletem uma discussão que remonta pelo menos ao início de nossa tradição filosófica. Na Política, Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) afirma que cabe à legislação regular a educação e torná-la 'pública' (politikós). Se a traduzirmos literalmente, a frase diz: tornar a educação política, ou seja, oferecer uma formação para a vida e os valores da Polis, da Cidade ou, se quisermos, da coisa pública (res publica). À educação não cabe priorizar a preparação para o êxito econômico do indivíduo, mas a valorização da vida política e do bem comum.

Assim também pensavam Charles de Montesquieu (1689-1755) e John Dewey (1859-1952): a república e a democracia exigem uma educação voltada para o cultivo das virtudes políticas da vida em sociedade. O que todos esses pensadores buscam ressaltar é que a educação tem, sim, um importante papel ético e político na formação dos cidadãos e de uma nação. E ela o cumpre não opondo, como sugere a matéria, o ensino de conteúdos escolares à formação para a cidadania, mas sim os articulando. De um ponto de vista pedagógico, o ensino de história ou de ciências não é simplesmente a transmissão de um conhecimento científico ou acadêmico axiologicamente neutro, mas uma forma de educar. Nós educamos e formamos nossos alunos, inclusive ética e politicamente, por meio do ensino da literatura, da história, das ciências, das artes.

E educar sempre implica critérios de seleção de conteúdos, estratégias e perspectivas. Implica ainda uma imagem de homem que se almeja formar, um tipo de relação com a sociedade, com o trabalho e com os outros. Em síntese, implica valores, posicionamentos éticos e políticos. Não há garantias infalíveis contra os riscos de doutrinação, nem na escola, nem na imprensa. As perspectivas educacionais de uma escola sempre refletirão valores e princípios de sua cultura institucional. Mas o farão sob a égide da autonomia e do pluralismo de que gozam na qualidade de 'escolas públicas'. Autonomia que parece ausente em publicações que só vislumbram os interesses do que é privado e particular, omitindo, num revelador ato falho, o caráter e o interesse público da educação.

Visão docente

Professores brasileiros reprovam o ensino médio e a atuação das famílias na educação.

Rubem Barros

O ensino médio é a pior etapa da Educação Básica e os problemas da escola estão intimamente relacionados à deterioração da instituição familiar. Essas são algumas conclusões a que se pode chegar, direta ou indiretamente, a partir de leitura da pesquisa A qualidade da educação sob o olhar dos professores, realizada em conjunto pela Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEA) e Fundação SM (ligada ao Instituto Idea, da Espanha), com consultoria de Maria Malta Campos, da Fundação Carlos Chagas.

A pesquisa computou respostas de 8.773 professores da Educação Básica (de 12 mil questionários enviados), que trabalham em 19 estados brasileiros, nenhum da região Norte. Foram 58 questões, distribuídas em sete categorias temáticas.

Na primeira delas, classificada como "Os fatores que incidem sobre a educação", sobressai a importância que os professores atribuem à família no processo escolar. Entre seis aspectos apresentados, este foi o mais mencionado como de muita incidência, com 92,5% dos respondentes, seguido pela escola (88,9%) e os meios de comunicação (81,8%). Os livros didáticos compõem o item menos citado como muito influente (54,1%).

Os docentes também consideram que a família delega cada vez mais à escola parte de suas responsabilidades educativas (91,7% deles concordam com a afirmação) e não crêem (80,7% deles) que os pais prestem atenção suficiente às atividades escolares dos filhos. Essa percepção negativa é mais alta entre os professores do ensino fundamental 2 (6º ao 9º ano), com 84,4%, e um pouco menor entre os da educação infantil (71,7%) e nas escolas particulares (71,1%).

Para completar o quadro de desalento de sua visão em relação à família, 51,2% dos docentes crêem que a convivência nas famílias dos alunos de suas escolas se deteriorou nos últimos anos (contra 16,7% que discordam da afirmação e 32,1% que lhe são indiferentes). A etapa da educação em que essa percepção é pior é o fundamental 2, com 55,9%. Nas escolas particulares, o índice baixa para 38,2% e na educação infantil para 39,8%.

A etapa com pior avaliação entre os docentes é o ensino médio, considerado ruim ou muito ruim por 46,3% dos professores; a mais bem avaliada é a educação infantil, vista como excelente ou muito boa por 39,9%. O maior índice de aprovação a essa etapa está entre os professores que estão no magistério há mais de 11 anos e menos de 20 (41,1%). Já a maior taxa de reprovação ao ensino médio (54,3%) está entre aqueles com mais de 30 anos de exercício profissional. Curiosamente, os próprios professores do ensino médio dão notas piores às outras etapas: 44,2% consideram a educação infantil ruim ou muito ruim, índice que sobe para 45,8% quando avaliam o fundamental 1 e para 50,6% no fundamental 2. O ensino médio é considerado ruim ou muito ruim por 29,4% de seus professores.
Entre as mudanças mais relevantes para o sistema educacional, desponta a reforma do plano de carreira para os profissionais da educação, considerada muito importante por 94,3% dos entrevistados. Outras medidas ressaltadas são a oferta de uma opção profissional de bom nível nas escolas de ensino médio (89,2%) e a ampliação da oferta de educação infantil nas escolas públicas (88,8%). A reorganização do ensino fundamental em três ciclos de dois anos e um de três anos é apontada por apenas 42,1% dos docentes.

Os novos pincéis

Vai uma dica legal para quem quer diversificar seu jeito de ensinar.

Ferramentas atuais para o ensino se estendem desde as novas tecnologias, como a internet, até o avanço do trabalho pedagógico feito por museus .



Arte se ensina com arte. Mais de 20 anos após esse conceito ser tratado em livros como O ensino por meio da arte (Perspectiva) e Tópicos utópicos (Com Arte), ambos da professora Ana Mae Barbosa, que abordava a importância da presença da imagem no ensino do objeto artístico, a discussão atravessou a barreira do século 21 e atingiu um patamar mais alto. Entre os novos atores deste ato estão os museus, por um lado, que vêm aprofundando o trabalho de formação de professores, e as novas tecnologias, por outro, que ampliam as possibilidades da arte-educação com a oferta de ferramentas sintonizadas ao mundo digital e a possibilidade de utilização de novas formas de construção de conhecimento.

O mais atual exemplo da ampliação do alcance das ferramentas no ensino da área é a midiateca lançada pelo Instituto Arte na Escola no último mês de junho. Desde que entrou no ar no site da entidade (www.artenaescola.org.br/midiateca), já obteve mais de 17 mil acessos, número que tende a crescer. A plataforma, por enquanto, é uma base digital para o material pedagógico da organização, que tem como objetivo divulgar e qualificar o ensino da arte - em especial a brasileira. Já fazem parte desse banco de dados 98 materiais, os quais exploram pedagogicamente instituições, artistas, obras, teorias e publicações. A maior parte do acervo é composta pela dvdteca, conjunto de vídeos digitalizados. "A riqueza da midiateca está justamente no acesso a todo um universo de possibilidades, sem estar preso a um só material. Isso amplia as opções e permite que o professor trabalhe com diversas metodologias e abordagens. De alguma forma, queremos que ele alcance mais rápido os resultados desejados", explica Monica Kondziolková, coordenadora de Comunicação do Instituto Arte na Escola.

A equipe dedicou um longo tempo de pesquisa para avaliar a forma como os educadores costumam utilizar ferramentas de busca na hora de planejar a aula. Uma bibliotecária foi encarregada de organizar o banco de dados e, assim, para cada elemento introduzido é necessário realizar um novo estudo e criar outro universo de palavras-chave. Por isso, o trabalho ainda caminha a passos lentos, levando em conta a quantidade de conteúdo que ainda precisa ser inserido. "Esse é o primeiro passo de um longo caminho. O objetivo principal é aumentar a acessibilidade, para que o material chegue ao maior número possível de pessoas", observa Denise Grinspum, gerente-geral do instituto. Com a ampliação do público, a etapa seguinte é elaborar instrumentos feitos especialmente para o espaço da internet. "A Midiateca transformou algo físico em virtual. O que já tínhamos foi postado e adaptado, mas não foi feito para aquele tipo de ambiente. Nosso desafio é desenvolver ferramentas mais adequadas, que tenham recursos mais dinâmicos", completa.

Na prática, a iniciativa da organização centraliza referências para o ensino da arte. Duas questões essenciais, porém, tornam o material diferente do que há disponível na web. A primeira é o fato de os trabalhos serem desenvolvidos especialmente para educadores, visando a formação do profissional. "A educação continuada é nosso grande desafio. Apenas dar acesso ao material não garante que o professor terá uma proposta interessante, porque ele vai trabalhar somente com o próprio repertório. Não adianta só oferecer o conteúdo, é preciso capacitar", argumenta Monica.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Os mistérios de Clarice

O incompreensível e o enigmático passeiam pelos caminhos de Lóri, personagem cuja sabedoria está em aceitar o que não entende e, com isso, ensinar quem pensa saber tudo.

Gabriel Perissé

Para conhecer a dimensão educadora da obra de Clarice Lispector (1920-1977), um bom caminho é Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres, publicado em 1969. Clarice, naquela ocasião, vivia momentos difíceis. Além dos cuidados que a saúde de um de seus filhos exigia, ainda se recuperava física e emocionalmente do incêndio em seu quarto, que a deixou gravemente ferida três anos antes, e do choque produzido pela morte recente de dois grandes amigos, os escritores Lúcio Cardoso e Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta).
Uma aprendizagem, segundo a autora, pediu-lhe uma liberdade maior, e ela teve de escrevê-lo com essa liberdade, humildemente: "Humildemente tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte do que eu". Foi, podemos pensar, um livro de superação, um aprendizado literário e existencial, um recomeço. Não à toa, uma das epígrafes é do poeta Augusto dos Anjos, relacionando "a mais alta expressão da dor" à alegria.
Trata-se, à primeira vista, de uma banal história de amor, com um tratamento muito diferente daquele, de inspiração metafísica, do seu romance anterior, A paixão segundo G. H. (1964), e sem a densidade de A maçã no escuro (1961).
Ulisses e Loreley (Lóri), dois professores, começam a namorar. Ele é professor universitário, de filosofia, e ela leciona na escola primária. O "desnível" sugere que Lóri teria muitas coisas a aprender com Ulisses, esperando dele algum tipo de avaliação, de orientação ou conselho. E, de fato, Ulisses assume o papel do mestre perante a discípula:
- É que você só sabe, ou só sabia, estar viva através da dor.- É.- E não sabe como estar viva através do prazer?- Quase que já. Era isso o que eu queria te dizer.

Lóri é ingênua... ou se faz de ingênua, perguntando-lhe como deve agir, se está acertando, se está sendo autodidata. Canto de sereia, talvez, que leva Ulisses a falar além da conta, investir ainda mais no tom professoral, um tanto pernóstico:
- (...) Muitas coisas você só tem se for autodidata, se tiver a coragem de ser. Em outras, terá de saber e sentir a dois. Mas eu espero. Espero que você tenha a coragem de ser autodidata apesar dos perigos, e espero também que você queira ser dois em um. Sua boca, como eu já lhe disse, é de paixão. É através da boca que você passará a comer o mundo, e então a escuridão de teus olhos não vai se aclarar mas vai iridescer.
Como professora, Lóri tem um comportamento maternal. Seus alunos são crianças pobres e, no inverno, usa a mesada que recebe do pai (nenhuma menção ao salário...) para comprar-lhes agasalhos, guarda-chuvas e meias de lã. Em suas aulas ideais, torna-se misteriosa: explica que a palavra aritmética "vinha de 'arithmos' que é ritmo, que número vinha de 'nomos' que era lei e norma, norma do fluxo universal da criança". Bem sabe a professora que tudo isso é incompreensível, mas faz parte do mistério da vida a lição de, por ora (ou para sempre), não entender.
Aliás, Lóri defende essa estranha didática:
"Não entender" era tão vasto que ultrapassava qualquer entender - entender era sempre limitado. Mas não-entender não tinha fronteiras e levava ao infinito, ao Deus. Não era um não-entender como um simples de espírito. O bom era ter uma inteligência e não entender. Era uma bênção estranha como a de ter loucurasem ser doida. Era um desinteresse manso em relação às coisas ditas do intelecto, uma doçura de estupidez.
O incompreensível e o enigmático passeiam pela obra de Clarice. Lóri, aos poucos, graças a esta sabedoria que aceita não entender nada, vai ensinando a Ulisses que ele também não sabe tudo. Incomoda ao filósofo, por exemplo, que a sua "aluna" prefira falar "o Deus", e não "Deus":
- (...) Mas eu queria saber por que você, em vez de chamar Deus, como todo o mundo, chama o Deus.- Porque Deus é um substantivo.- É a professora primária que está falando.- Não, Ele é substantivo como substância. Não existe um único adjetivo para o Deus.
Desconcertado, o professor do ensino "superior" descobre que precisa aprender coisas "primárias", primeiras. E quando os dois finalmente se encontram para o amor, não é mais aluna e mestre que estão ali, embora um continue a aprender com o outro. Pois esta é a essência do aprendizado: quem ensina precisa aprender.
O primeiro aluno e o professor sabe-tudo
Todo escritor tem consciência do quanto influência a visão de mundo dos seus leitores. Em depoimento gravado para o Museu da Imagem e do Som (20/10/76), Clarice referia-se ao Uma aprendizagem: "É uma história de amor. E duas pessoas já me disseram que aprenderam a amar através desse livro. Pois é".
Mais do que as linhas, são as entrelinhas que influenciam. Mesmo esse coloquial "pois é" pode ser interpretado de várias formas. Haverá nele um pouco de ironia, de resignação, de admiração, de gracejo. E este é outro dos ensinamentos de Clarice: existem segredos e desdobramentos onde tudo parece simples e cotidiano.
Como em outro texto seu, intitulado O primeiro aluno da classe, com o qual somos apresentados a um menino de nove anos extremamente ajuizado, solícito (empresta livros aos colegas da escola, ajuda-os a entender a matéria), cujo segredo é um caracol. Clarice repete que o segredo dele é um caracol, antes de finalmente contar o porquê...
Seu segredo é um caracol. Do qual não esquece um instante. Seu segredo é um caracol que o sustenta. Ele o cria numa caixa de sapato com gentileza e cuidado. Com gentileza diariamente finca-lhe agulha e cordão. Com cuidado adia-lhe atentamente a morte. Seu segredo é um caracol criado com insônia e precisão. (em: Para não esquecer, 1978)
Difícil evitar um estremecimento diante da contradição do menino, que é tão humana, tão nossa: somos delicadamente sádicos, gentilmente perversos, secretamente maus. Na espiral do caracol, o menino experimenta a impiedade. E esta impiedade meticulosa, infinita, sustenta sua solicitude pelos colegas, sua humanidade, sua pertença à escola e à sociedade dos "bons", seu prestígio de aluno correto.
É terrível e bela a imagem do menino torturador. Há coragem e beleza nesta revelação - o segredo do menino agora também é nosso. E cada qual tem o seu caracol.
Há uma energia emocional nesse texto, que precisa ser recriada pelo leitor. Vale dizer: para realizar uma leitura educadora precisamos tomar posse dessa energia, como quem recebe uma herança, mesmo sem esperá-la. Contudo, só a receberemos efetivamente se for de modo ativo e comprometido. A leitura educa, sim, com uma condição: que cada um de nós, mesmo não entendendo, traduza para si mesmo o que apreendeu.
Para Clarice, literatura é exercício de vida, sofrido e inexplicável. Cada livro concluído leva a uma morte parcial, até que se abra outro ciclo de criação. Nada de racionalizações ou fórmulas infalíveis. O professor que aparece em A maçã no escuro representa a postura que Clarice jamais adotaria. O professor é idolatrado pelas personagens femininas, Vitória e Ermelinda. Uma delas, Vitória, querendo elogiá-lo, chega a afirmar que deveria escrever um romance. A reação do professor é imediata:
- Não poderia! (...), aí é que está! Não poderia, exclamou penoso, não poderia porque tenho todas as soluções! já sei como resolver tudo! não sei como sair desse impasse! para tudo, disse ele abrindo os braços em perplexidade, para tudo eu sei uma resposta!

Não procuremos soluções. Não esperemos respostas prontas. Por que, por exemplo, Clarice tinha fascinação pelo nome "Ulisses"? Ulisses é o professor de Uma aprendizagem, mas é também o nome do cachorro de que a autora cuidava, e que aparece pelo menos em dois momentos ficcionais, como narrador no livro infantil Quase de verdade (1967) e como o cachorro de Ângela, em Um sopro de vida (1978).Vai entender...

Fábrica de perguntas


Embora tenha sido gestada no início do século 20, a física moderna ainda é ignorada pelo currículo do ensino médio brasileiro e os alunos não têm contato com seus principais conceitos. Ao apresentá-los ao público, apostando na tecnologia e na interatividade, a exposição Einstein, instalada em setembro no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, não preencherá essa lacuna, mas poderá fazer algo mais relevante: deixar os estudantes cheios de perguntas.
Criada em 2002 pelo Museu de História Natural de Nova York, a exposição rodou o Hemisfério Norte e foi vista por 2 milhões de pessoas. Os organizadores, do Instituto Sangari, esperam receber de 300 mil a 400 mil visitantes até o encerramento paulistano da mostra, em 14 de dezembro.
O percurso da exposição, orçada em R$ 5 milhões, é dividido em dez blocos temáticos, nos quais se entrelaçam aspectos biográficos e científicos relacionados a Albert Einstein (1879-1955): Vida e tempo, Luz, Tempo, Átomos, Energia, Gravidade, Guerra e paz, Cidadão global, Legado e Einstein no Brasil. Além das diversas instalações que explicam interativamente os conceitos científicos relacionados às inúmeras contribuições de Einstein, a mostra visa tornar familiar a figura do cientista, mostrando objetos pessoais, fotos, cartas e manuscritos. De acordo com o professor do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Marcelo Knobel, responsável pela coordenação científica da mostra, a versão brasileira foi adaptada e ampliada. "Todos os painéis interativos foram elaborados pela equipe brasileira. Além disso, foram recriados praticamente todos os textos e acrescentadas duas instalações que não existiam - Átomos e Einstein no Brasil. Acrescentamos na mostra diversos aspectos relacionados ao Brasil e melhoramos bastante também a parte relacionada ao legado de Einstein", afirmou.
O texto foi sintetizado, pois a versão original era bem mais longa. "Havia aspectos de interesse mais do público norte-americano que foram atenuados, como a perseguição a Einstein pelo macarthismo", exemplifica Knobel.
O espaço da exposição, que totaliza 2 mil metros quadrados, inclui um laboratório para atividades com educadores e, nos fins de semana, um ciclo de palestras relacionadas ao tema. Há um programa educativo especialmente voltado a dar suporte às visitas de grupos de estudantes, incluindo materiais educativos, visitas monitoradas e formação para educadores.
Knobel, também diretor científico do Instituto Sangari, explica que os painéis de textos, ilustrações didáticas e obras interativas têm o objetivo principal de estimular os estudantes a conhecer as teorias de Einstein - o que representará um salto de 200 anos em relação ao que se aprende hoje em física nas escolas. O conteúdo pedagógico se limita à física de Isaac Newton, concebida no século 18.
"Não se aprende nada de física quântica ou de relatividade no ensino médio. No entanto, ainda que pareça incrível, a matemática utilizada para entender a relatividade não é tão complexa - pode ser toda demonstrada apenas com o teorema de Pitágoras. O que provoca um nó na cabeça são as conseqüências extraídas dessa teoria. Isso fica claro na exposição. Não esperamos que o estudante saia da exposição sabendo tudo sobre a física de Einstein, mas temos a preocupação de fazê-lo sair dela cheio de curiosidade e novas perguntas", diz.
Biografia didáticaKnobel ressalta que o aspecto didático da exposição não se restringe à compreensão das teorias do físico nascido na Alemanha. A forte componente biográfica presente é importante para desmistificar a pessoa de Einstein. "Tentamos mostrar que Einstein foi uma pessoa como todos nós e enfrentou problemas familiares, divórcio e dificuldades", explica.
Retratada em todas as suas dimensões, a atribulada vida do físico ajuda também a compreender diversos aspectos culturais do século 20, pois o material exposto não se destina apenas a quem gosta de física, mas também a quem se interessa por saber mais sobre o mundo em que vivemos. "A idéia não é que o visitante saia dominando conceitos da física, mas que saia com número ainda maior de perguntas, estimulado a saber mais", filosofa o coordenador.
A mostra inclui objetos do acervo pessoal do físico, como fotos em momentos de lazer, ou recebendo o Prêmio Nobel, além de reproduções das cartas trocadas com o psicanalista Sigmund Freud (nas quais o exortava a juntar esforços e usar a influência política de ambos para lutar contra a guerra) e com o físico Niels Bohr, que em uma delas troca farpas com Einstein, referindo-se à celebre frase do físico alemão: "Deus não joga dados".
O acervo pessoal traz peças impagáveis, como uma carta de 1901 do cientista à namorada, Mileva Maric, que conhecera no Instituto Federal Suí­ço de Tecnologia e seria sua primeira mulher: "Minha querida gatinha. Acabo de ler um maravilhoso artigo sobre a geração de raios catódicos para a luz ultravioleta".
Os trechos dos diários de Einstein apresentados também reservam momentos curiosos, como as anotações sobre sua visita ao Rio de Janeiro em 1925: "Deliciosa mistura étnica nas ruas. Portugueses, índios e negros em todos os cruzamentos. Espontâneos como plantas, subjugados pelo calor. Experiência fantástica. Uma indescritível abundância de impressões em poucas horas".A exposição ainda retrata a relação de Einstein com familiares, as viagens, a atuação pacifista durante a Segunda Guerra Mundial e a luta contra o racismo. São mostrados também diversos momentos históricos, como a manchete do jornal Times, de Londres, em 7 de novembro de 1919, que transformava Einstein repentinamente em uma celebridade mundial: "Revolução na ciência. Nova teoria do Universo. Idéias de Newton derrubadas".
Destaques interativosEscolas e grupos de estudantes podem agendar visitas monitoradas por educadores especializados. A exposição oferece um curso gratuito para os educadores, no qual são fornecidos subsídios teóricos para a preparação das visitas com os alunos e para o trabalho em sala de aula. Esses cursos, denominados "Encontro de educadores", têm três horas de duração e acontecem às quartas-feiras e sábados. No percurso da mostra foram montados dois laboratórios de aprendizado, onde os estudantes participam de atividades que abordam conceitos vistos na exposição.Um dos laboratórios permite que os visitantes vejam, com o auxílio de microscópios, o movimento browniano, descrito por Einstein em 1905. No outro laboratório, os estudantes podem explorar as propriedades da luz, realizando experimentos de espectroscopia óptica.
A exposição dedica um bom espaço ao episódio que tornou Einstein uma celebridade mundial - e que teve relação com o Brasil. Em 29 de maio de 1919, uma observação de um eclipse feita em Sobral, no Ceará, e na ilha de Príncipe, na África, mostrou que a gravidade do Sol agia como uma lente, desviando a luz das estrelas distantes que apareciam no céu em posições diferentes das originais. Era a confirmação de uma previsão feita por Einstein em 1916, corroborando a Lei da Relatividade Geral.
Estão presentes painéis explicativos e interativos sobre os conceitos relacionados a buracos negros, o efeito fotoelétrico, as reflexões sobre a luz e o tempo, a gravidade, a curvatura do espaço-tempo, e a Teoria da Relatividade Geral.
A instalação "Teia de luz" propõe ao visitante o desafio de atravessar uma sala cortada por feixes de luz sem tocá-los. Uma obra do artista Guto Lacaz demonstra que o ritmo com que flui o tempo depende do referencial e da velocidade do observador. A instalação interativa "Máquina do tempo" exibe a variação da passagem do tempo proporcional à velocidade relativa do visitante que, ao fornecer a data de nascimento, pode observar em vários relógios que idade teria se estivesse viajando em diferentes frações da velocidade da luz.
Outro destaque, na seção "Legado", é a instalação "OP_ERA: Sonic Dimension", das artistas Rejane Cantoni e Daniela Kutschat, uma "harpa de luz" que remete às inspirações artísticas provenientes das teorias de Einstein. A mostra apresenta também um painel com cartas escritas ao cientista por crianças de sua época.

EINSTEIN

Pavilhão Engenheiro Armando de Arruda Pereira - Parque Ibirapuera, Portão 10, até 14 de dezembro.

De terça a sexta, de 9h às 21h; sábados, domingos e feriados das 10h às 21h.

Ingressos a R$ 15 (meia-entrada de R$ 7 para estudantes e professores); grátis para menores de 7 anos, maiores de 60 anos e excursões agendadas de grupos de escolas públicas.

Telefone para agendamento: 0300 789 0002 ou (11) 3468-7400

A invenção realista

Os bons escritores são bons mestres. Suas palavras desencadeiam a nossa sensibilidade, retiram-lhe os cadeados. Com esses mestres, podemos aprender o que nem sempre a escola tem condições de ensinar. Podemos aprender a nomear o que nem sabíamos existir. Podemos aprender a pensar, de maneira coerente, com idéias diferentes das nossas. Podemos sentir o que nem sempre experimentamos com grande intensidade no dia-a-dia: angústias, medos, alegrias, ódios, amores. Podemos descobrir que a vida, tão corriqueira na maior parte das vezes, esconde muitas outras dimensões: o fantástico, o dramático, o cômico, o trágico, o surreal, o absurdo, o romântico, o onírico, o heróico...
Graciliano Ramos (1892-1953) é, nesse sentido, um dos maiores mestres da literatura brasileira. Seus livros têm a força da realidade, sem concessões. A ficção, paradoxalmente, constitui forma excelente de descrever o real. Graciliano nos ensina a olhar o nosso entorno de maneira corajosa, sem perder de vista a fabulação e a invenção.
Geografia obrigatória
Sempre há muitas portas de entrada na obra de um grande escritor. No caso de Graciliano, escolho o livro infanto-juvenil A terra dos meninos pelados. Foi escrito logo após ter saído da prisão, logo após aqueles dez meses e dez dias que seriam a matéria-prima de Memórias do cárcere, publicadas postumamente (1953). Em 1937, porém, ainda esmagado pelas experiências extremas da cadeia, Graciliano não estava pronto para as Memórias, e se deixou conduzir pelo maravilhoso e pela fantasia. A terra dos meninos pelados nada tem a ver com renúncia à visão de mundo visceralmente realista do autor. A imaginação, isso bem sabem os artistas, nos faz com­preender o mundo de uma forma radical, talvez com mais "exatidão" do que as ciências exatas...
O livro conta a história de um menino "diferente dos outros meninos", que tinha a cabeça pelada e olhos com duas cores diferentes: o direito preto e o esquerdo azul. A falta de cabelos remete à situação do prisioneiro, despojado de tudo, no limiar da morte. O olhar duplo é o daquele que enxerga a realidade e a fantasia ao mesmo tempo: não se perde na fantasia, mas também não se limita aos dados da realidade imediata. O menino, que se chama Raimundo, é discriminado pela vizinhança. Fala sozinho, não porque enlouqueceu, mas porque está criando um mundo, a terra de Tatipirun, para onde se dirigirá.
O primeiro habitante que o menino encontra é um automóvel com olhos bicolores, que não atropela ninguém, mas voa. O segundo, uma laranjeira que lhe dá orientações. Quando Raimundo lhe pede que ensine o caminho, a árvore responde: "Vá seguindo sempre. Todos os caminhos são certos". Mais adiante o protagonista encontra outros meninos, todos calvos e olhos iguais aos seus: um preto e o outro azul. E encontra também Caralâmpia, a princesa.
Em Tatipirun, o sol não se põe, a temperatura é amena, não chove, os meninos não adoecem nem envelhecem, o rio se fecha para as pessoas passarem, os animais falam, as cobras não picam, não há casas, o chão é macio, ninguém precisa usar sapatos, vestem-se com túnicas confortáveis, os habitantes descansam fechando um dos olhos e deixando o outro aberto.
Ali ele se sente bem, embora se lembre de vez em quando de que precisa voltar para estudar a lição de geografia! Um dos seus novos amigos pergunta se é necessário estudar essa matéria. Raimundo responde: "Sei lá! Dizem que é necessário. Parece que é necessário. Enfim... não sei". E conclui, choroso: "É uma obrigação". E por causa da obrigação, Raimundo volta para casa, prometendo "ensinar o caminho de Tatipirun aos meninos" de sua terra.
As lições de Tatipirun
São várias. Talvez a mais significativa é que todos os caminhos do conhecimento e do crescimento são bons. Cada lugar tem suas peculiaridades e belezas e sempre podemos aprender. No mapa da humanidade, as diferenças são riquezas a valorizar. A princesa de Tatipirun, Caralâmpia, diz ter conhecido uma terceira região, cujos habitantes possuem duas cabeças, oito olhos (quatro azuis e quatro pretos, distribuídos de dois em dois pelas testas e nucas), uma boca no peito, cinco braços e uma perna só.
O nome da princesa Caralâmpia remete à psiquiatra alagoana Nise da Silveira que, quando menina, remexendo nas provas dos alunos de seu pai, descobriu que um garoto com o sobrenome Caralâmpio fora reprovado por ele. Nise perguntou-lhe por que alguém com nome tão bonito sofreria aquela punição. O pai achou graça e passou a chamá-la de "Caralâmpia". Graciliano, seu conterrâneo e amigo, chamava-a assim também, e esse apelido tornou-se sinônimo de compreensão com os reprovados pela sociedade, pela escola, pela vida.
Caralâmpia, espécie de mestra das crianças de Tatipirun, procura compreen­der o outro, o diferente, o monstruoso. Pois este é o problema maior. Raimundo não é considerado apto a viver com os seus dessemelhantes. Foge para outro lugar, um lugar ideal em que todos fossem iguais a ele. Mas Caralâmpia está fascinada pelo diferente, e Raimundo termina por entender que problemáticos são os meninos normais de sua terra, ou que se consideram normais pelo fato de terem cabelos e seus olhos serem da mesma cor. Para adaptar-se à realidade adversa, Raimundo terá de amadurecer. E quando zombarem dos seus olhos e de sua cabeça pelada, ensinará aos zombadores a geografia secreta de Tatipirun.
Raimundo renuncia à evasão, volta à sua realidade cotidiana, mas volta com novas disposições. Tornou-se contador de histórias, transformando seu sonho pessoal em narrativa. Tatipirun é uma terra diferente, com outra lógica, outra beleza. Entenderão os garotos que o outro não é necessariamente ridículo?
Os dois mundos de Raimundo
Não existe fantasia pura. O escritor transfigura o real e nos entrega uma nova realidade, a da ficção, com a qual nos reaproximamos do mundo. No seu livro Viventes de Alagoas (1961), Graciliano publicou uma crônica intitulada Dr. Pelado, médico e poeta popular nascido no século 19, que se chamava justamente Raimundo Pelado, "um grande mulato risonho e fornido, de bela cor vermelha, mãos rijas, dentes fortes e olhos vivos".
Este Pelado verdadeiro era igualmente um pródigo contador de histórias:
Existiam na vida dele muitos casos interessantes: viagens complicadas ao Rio, à Bahia, ao Recife. Tinha visto o Imperador e outras figuras enormes, tinha tido uma discussão notável com certo chefe de polícia de capital graúda. Sua Majestade era pessoa muito simpática. E o chefe de polícia ficara absolutamente arrasado, fato que provocava o espanto dos caixeiros e dos fregueses, nas lojas.
Que Graciliano "usasse" o Raimundo Pelado de verdade para criar o seu personagem "de mentira" confirma o quanto é frágil a separação entre fato e ficção. O Pelado histórico tinha também um duplo olhar. Vivia em duas dimensões, a prática e a fantástica. Um olho para a sobrevivência material e outro para a poesia. Quando precisava ganhar dinheiro, percorria cidades do interior do Nordeste com textos e gravuras de Chernoviz (médico polonês radicado no Brasil que se dedicou à medicina popular) e medicamentos os mais variados para as moléstias da população carente:
Regressava ao cabo de seis meses, largava a ciência e dedicava-se inteiramente à sua ocupação natural, a poesia.Graciliano foi encarado como subversivo pela ditadura Vargas. Mas o seu comunismo não era o mais perigoso. Aliás, mestre Graciliano fazia restrições ao modelo stalinista e mantinha-se distante de exaltações ideológicas. Seu verdadeiro potencial subversivo (e educador) estava na invenção realista de outros mundos. A precisão com que nos fez ver as vidas secas, o cárcere desumano, a infância das crianças nordestinas, o destino de quem é vítima do ciú­me mórbido (Angústia, 1936), ou de quem se afunda na vertigem da ambição desmedida (São Bernardo, 1934) é a precisão de um estilo em que a objetividade enfatiza o poder transformador da imaginação.

Agenda de Dezembro

PSIQUIATRIA - O Instituto de Psiquiatria da UFRJ prepara o "Simpósio Psiquiatria Forense na Atualidade". O evento será realizado nos dias 5 e 6 de dezembro. Na programação, há dois cursos pré-simpósios e apresentação de trabalhos. As inscrições estão abertas. Informações pelos telefones 2295-2549 e 3684-7882 ou pelo e-mail simposio@ipub.ufrj.br
FISIOTERAPIA - A ABBR irá oferecer o curso "Estabilização Segmentar Vertebral" entre os dias 6 e 9, das 8 às 18 horas. As aulas abordarão aspectos como morfologia e biomecânica da coluna . Profissionais e estudantes a partir do 6° período podem participar. Inscrições até esta terça-feira, dia 4. Mais informações: 3528-6404.
COMUNITÁRIA - A UFRJ promove o 3° Encontro de Comunicação Comunitária com o tema "As Teorias e Práticas Contra-hegemônicas da Comunicação e da Cultura". O evento será realizado nos dias 7 e 8 no auditório Anízio Teixeira. Haverá palestras, lançamentos de livros, manifestações artístico-culturais e oficinas . As inscrições devem ser feitas deixando um comentário no blog http://leccufrj.wordpress.com, com nome, e-mail e instituição de ensino.
LUSITANO - O Real Gabinete Português de Leitura realiza o encontro "O Caso Galego: Como Somos Vistos" na terça-feira, dia 4, às 14:30 horas. A entrada é franca. Mais informações: 2221-3138 ou 2221-2960.
COMUNICAR - A UniCarioca iniciou a Semana Universitária : Comunicar na última segunda-feira, dia 3. O evento vai até sábado, dia 8, com palestras gratuitas e abertas aos universitários. No último dia, haverá a 5ª edição do Festival Vídeo Minuto com a exibição de filmes de duração de um minuto de alunos de qualquer curso e instituição. O tema é livre. Informações: 2563-1919.
CURSOS - A Estação Futuro Uruguaiana, do Viva Rio, abre inscrições para cursos básicos de informática, língua portuguesa e redação. Haverá certificados de conclusão. Os cursos têm valores entre R$50 e R$60 reais. Mais informações: 2221-9967.
Fonte: Site Folha Dirigida - acesso em 10/11/2008.

Agenda de Novembro

BIBLIOTECA - A Fundação Biblioteca Nacional realiza nos dias 27 e 28 de novembro o 8º Encontro Nacional de Acervo Raro (ENAR). O curso é gratuito e destinado a curadores e profissionais de acervos raros e especializados, estudantes etc. Informações: 3095-3891.
GESTÃO E TI - Entre os dias 10 e 13 de novembro, a partir das 19h30, a Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap) promoverá o 9º Workshop de Gestão de TI. No evento, os interessados poderão participar de diversas palestras voltadas para os segmentos de Tecnologia e Administração. Os ciclos de palestras acontecerão no Campus I da instituição, localizado à Av. Lins de Vasconcelos, 1.264 – Aclimação. As inscrições são gratuitas e devem ser realizadas pelo endereço eletrônico www.fiap.com.br.
AMAZÔNIA - A Agenda Acadêmica da UFF terá o tema "Amazônia: da Natureza à Inovação Tecnológica" e será realizada entre os dia 24 e 28 de novembro. O evento é anual e apresenta a produção da instituição nas áreas de ensino, pesquisa e extensão. Programação e inscrições no site http://graduacao.uff.br/agendaacademica.
MÚSICA - Nesta segunda-feira, dia 10, o Centro Loyola de Fé e Cultura apresenta a série Música no Museu. O Trio Chiquinha Gonzaga irá tocar canções de Dorival Caymmi, Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Newton Mendonça, Baden Powell, entre outros, a partir das 19 horas. Essa será a última apresentação de 2008. A entrada é franca. Mais informações: www.musicanomuseu.com.br.
Fonte: Site Folha Dirigida - acesso em 10/11/2008.

Acesso negado à chave do conhecimento

Pouca gente sabe mas, no último dia 29 de outubro, foi comemorado o "Dia Nacional do Livro". Escolhida por representar a fundação da Biblioteca Nacional, a data, infelizmente, não costuma ser lembrada pela grande maioria dos brasileiros, provavelmente pelo fato de não significar um feriado prolongado ou um dia de descanso no trabalho. Esquecer a importância da leitura para a construção da cidadania e de uma sociedade mais justa e democrática, porém, é um mal que pode levar gerações para ser reparado.
Em artigo escrito recentemente, o ex-representante da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no Brasil, Jorge Werthein, ressalta por que o incentivo à leitura é matéria essencial quando se fala em desenvolvimento sociocultural. "A pessoa que não sabe ler, nem escrever, se sente profundamente limitada e discriminada. Não consegue entender o jornal, não sabe pegar ônibus, nem possui condições para obter um emprego. Sua auto-estima é baixa", relata o atual diretor-executivo da Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla).
Ainda segundo o dirigente, disposição não falta para que o brasileiro consiga ler mais e melhor. "O Instituto Nacional de Analfabetismo Funcional (Inaf) informa que 67% dos brasileiros têm interesse na leitura. Mas, dos 5.564 municípios existentes no país, em cerca de mil não existem bibliotecas. E, em 89% deles, não existem livrarias", destaca Werthein, como numa forma de puxar o barbante do novelo e começar a descobrir as causas da falta de leitura no cardápio do brasileiro.
Em entrevista publicada na última página da edição, o secretário-executivo do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), José Castilho Marques Neto, defende os esforços do governo neste sentido. "Este é um caminho que, de acordo com o conjunto de ações que estamos implantando com outros ministérios, nós esperamos reverter." As críticas aos esforços do governo, porém, parecem ser a tônica das opiniões de representantes da comunidade acadêmico-cultural.
Presidente do Conselho Federal de Biblioteconomia, Nêmora Rodrigues lamenta a situação das bibliotecas. "Elas passam por uma série de dificuldades, falta acervo atualizado e equipamentos para se tornarem mais atrativas. Hoje, com a multimídia e todas as oportunidades de interação, o computador poderia ser um atrativo para a pessoa freqüentá-la e, a partir daí, ler também o livro em papel", afirma.
Para o presidente do Instituto Pró-livro, responsável pela pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", Jorge Yunes, a falta de leitura está vinculada aos níveis de escolaridade do país. "O incentivo à leitura nas escolas é muito importante, o governo tem que trabalhar para que esse índice seja igual no Brasil inteiro. Se a escolaridade aumentar, com certeza a leitura aumenta também", aponta.
Presidente de honra da Academia Brasileira de Filologia, Leodegário de Azevedo Filho vai além e cobra qualidade. "A leitura é muito importante para a construção de uma consciência cidadã. Mas, antes de tudo, precisamos questionar que tipo de leitura é essa. É necessário estabelecer uma relação entre o proveito da leitura e o conceito de cidadania. Tanto a leitura quanto uma interpretação crítica dos textos lidos levam o leitor a conhecer os direitos humanos e, de uma maneira geral, seus direitos e deveres perante a sociedade", comenta o professor de Língua Portuguesa.
Ainda segundo o educador, a leitura é indispensável para a construção do cidadão, mas enfrenta sérios concorrentes. "O Brasil, hoje, é um país ilegível, que não lê. E, para que isso esteja acontecendo, vários fatores contribuem. A televisão, por exemplo, é muito útil, importante para o entretenimento das pessoas, mas rouba muito tempo em nossos lares. Tempo esse que poderia ser dedicado à leitura."
Leodegário finaliza o seu raciocínio lembrando da importância da educação para a resolução do problema. "Num país que tem 14 milhões de analfabetos entre 7 e 14 anos, como podemos ter um público leitor? É por isso que esta questão passa pela educação, de uma forma geral. A leitura é a verticalização, a formação crítica do conhecimento. Mas o fator principal para que tenhamos uma população cidadã é a educação", estabelece o educador.

Fundo Pró-Leitura poderá ser criado pelo governo
A preocupação quanto à falta de incentivo à leitura no país chegou ao Congresso Nacional no Dia do Livro. Reunidos para o I Seminário de Incentivo à Leitura no Brasil, promovido pela Frente Parlamentar Mista da Leitura e realizado na Câmara dos Deputados, o ministro da Cultura, Juca Ferreira, parlamentares e dirigentes ligados ao meio literário discutiram soluções para o setor. "O Fundo Pró-Leitura, uma forma de financiamento das ações previstas no Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), poderá ser criado por decreto presidencial", anunciou o ministro.
O fundo seria uma contrapartida do setor livreiro, com cerca de 1% de seu faturamento anual, à desoneração imposta pelo governo federal de impostos como PIS e Cofins sobre a produção de livros no país. Se aprovado, pode gerar R$46 milhões por ano para as políticas oficiais de incentivo à leitura. Um dos entraves para a sua criação é o conceito de ser conflitante com a proposta de reforma tributária da União. Mas o ministro tratou de garantir que as negociações no Palácio do Planalto estão adiantadas. "Não é imposto, mas contribuição voluntária", explicou.
Coordenador da Frente Parlamentar, o deputado Marcelo Almeida (PMDB-PR), lembrou que fará uma mobilização nos próximos dias para convencer lideranças partidárias da importância do Fundo. "Dificilmente há oposição quando o assunto é leitura. O mundo da leitura é um mundo diferenciado. Nele, as pessoas não são nem de direita, nem de esquerda. Acho que todo mundo está no meio e com um passo à frente", considerou.
O deputado lembrou que a situação do país é preocupante em relação às estatísticas que apontam hábitos de leitura. "O país lê muito pouco. Na França, por exemplo, são 10 livros por ano para cada cidadão, enquanto aqui temos uma média de 4,7. O prazer da leitura ainda não está embutido na alma do brasileiro", lamentou.
Além de recursos, os participantes do encontro sugeriram medidas práticas para incentivar a leitura entre os brasileiros. Segundo o jornalista Laurentino Gomes, autor do livro 1808, a quase ausência do hábito de ler livros no Brasil é um dado histórico e remonta aos tempos do Brasil Colônia. "Somente com a vinda da corte portuguesa para o Brasil, há 200 anos, o país passou a ter livros e imprensa, ainda assim com censura", destacou.
Segundo ele, que contou com o apoio do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), presidente da comissão de Educação e Cultura do Senado, a edição de livros em vários formatos e linguagens, para atender aos diferentes interesses de crianças, jovens e adultos, pode ser uma solução viável. Professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Aníbal Bragança sugeriu uma intervenção junto aos os leitores, para que as políticas públicas possam atender melhor às suas necessidades.

Pesquisa indica dados preocupantes
O número é revelador: 77 milhões de brasileiros não lêem livros regularmente. Esta é a constatação da pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", encomendada ao Ibope pelo Instituto Pró-Livro, divulgada em maio e que abrangeu 172,7 milhões de pessoas, já que foi aplicada em 5.012 pessoas de 311 municípios, ou seja, 92% da população. Segundo o relatório, 95 milhões de brasileiros leram pelo menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa, realizada no final de 2007.
As mulheres lêem mais do que os homens, e a Bíblia é a obra mais importante para os adultos. As crianças, por sua vez, preferem publicações como o "Sítio do Pica-pau Amarelo", "Chapeuzinho Vermelho" e a série "Harry Potter". A adolescência e a infância são apontadas como as fases em que as pessoas mais lêem: sete crianças, em cada grupo de dez, são leitoras.
De acordo com a pesquisa, 66% dos livros estão nas mãos de 20% da população; 8% dos brasileiros não têm nenhum livro em casa; e 4% têm apenas um. A maioria dos leitores (55%) costuma ler apenas trechos ou capítulos; 11% pulam páginas e 38% lêem o texto inteiro. O estudo mostrou, ainda, que 21,4 milhões dos leitores têm contato com os livros apenas por obrigação, mas 71,7 milhões dizem sentir prazer nessa atividade. Os escritores mais admirados no Brasil são Monteiro Lobato, Paulo Coelho, Jorge Amado e Machado de Assis.
O relatório também aponta que os classificados como não-leitores estão na base da pirâmide social: 28% deles não são alfabetizados e 35% estudaram só até a 4ª série do ensino fundamental. Entre os motivos para não ler, a falta de tempo aparece como o mais apontado, com 29%. Outros 28% não lêem porque não são alfabetizados e 27% porque não gostam ou não têm interesse.
Entre as limitações, 16% afirmaram possuir ritmo lento de leitura e outros 7% disseram não compreender a maior parte do que lêem. As regiões Norte e Nordeste, que apresentam os menores índices de desenvolvimento humano (IDH) do país, também registraram as menores médias de leitura por habitante/ano: 3,9 e 4,2 respectivamente. A média nacional é de 4,7 livros ano/habitante. Na Região Sul, a média de leitura anual é maior do que a nacional, com 5,5 livros.
Fonte: Site Folha Dirigida - acesso em 10/11/2008.

Pós-graduação e a era digital

Ouve-se com freqüência a assertiva no sentido de que a qualidade (o nível cultural) do aluno brasileiro que chega ao curso superior ou a um curso de pós-graduação tem sido normalmente deplorável.
O Brasil praticamente universalizou a educação fundamental (faixa etária de 6 a 15 anos, depois das Leis 11.114/2005 e 11.274/2006): 97% das crianças e adolescentes estão na escola. Mas é grave a situação do "antes", do "durante" e do "depois" do ensino fundamental, ou seja, do ensino infantil (até os 6 anos), dos que chegam à 8ª série e do ensino médio (faixa etária de 15 a 17 anos). Também é preocupante a situação brasileira relacionada com os cursos superiores e as pós-graduações.
Apenas 57% dos alunos do ensino fundamental chegam à 8ª série. Em relação ao ensino médio, enquanto no Brasil somente 14,4% completam esse nível de estudo, na Índia o percentual é de 28,2%, na China é de 45,3%, Coréia do Sul é de 55,2%, no México é de 37%, no Chile é de 35,7%, na Argentina é de 31,1% etc. Cinco milhões de jovens brasileiros, entre 15 e 17 anos, não estão freqüentando nenhum tipo de escola. No que diz respeito à qualidade desse ensino médio, apenas 4,4% dos alunos conseguiram alcançar em matemática a média dos países da OCDE; em leitura, apenas 11%. A competitividade global do Brasil vem caindo a cada ano: de 1990 a 2004 passamos da 8ª para a 14ª posição entre as maiores economias mundiais. Mais de 50% dos adultos no Brasil são analfabetos funcionais ("Brasil, o Estado de uma Nação", Ipea, 2006).
É preciso reconhecer, ainda, que muitas vezes o acadêmico do ensino superior chega à universidade preparado, mas se transforma no grande responsável pelo seu insucesso educacional. Oportunidades lhe são oferecidas (ou seja: o ensino muitas vezes é bom), mas o que ele deseja mesmo é ser protagonista de uma ficção. Há alunos que durante cinco anos enganam os outros (pais, parentes etc.) e a si mesmos. A culminância do engodo acontece quando ele compra, via internet, o trabalho final de conclusão do seu curso.
Uma vez diplomado, chega a realidade, isto é, chega o dia em que ele tem que definir seu destino, sua profissão, seu futuro, sua pós-graduação e, agora, não tem mais como enganar ninguém.
No Brasil o aluno que conclui o ensino superior faz parte de uma elite privilegiada, visto que apenas 11% da faixa etária universitária estão cursando uma faculdade no Brasil. Trata-se de percentual muito pequeno quando comparado com outros países (Argentina quase 20%, Chile 38%, Coréia do Sul mais de 60% etc.). O percentual se reduz drasticamente quando se enfoca a pós-graduação. São poucos os que cursam universidade; pouquíssimos os que freqüentam uma pós-graduação.
Conclusão: não estamos formando mão de obra qualificada que possa aumentar a chance de empregabilidade e atender a demanda exigida pelo mercado. Isto sem considerar o papel mais fundamental do ensino que é a formação integral do indivíduo. Comparativamente, são poucos os alunos que estão estudando no Brasil (ensino médio, nível superior e pós-graduação).
Muitos são os fatores que vêm contribuindo para o propalado desastre educacional brasileiro. Um deles, seguramente, diz respeito aos métodos de ensino. Uma boa forma de educar compreende um duplo processo: transmitir conhecimentos ao aluno e proporcionar meios para fazê-lo aprender. Além disso, o aluno tem que compreender, de qualquer modo, que é o seu esforço que o tornará capaz de melhor apreender (sedimentar) os conteúdos trazidos para a aula pelo professor. Mas isso o que temos visto (de um modo geral) no Brasil.
Para que sejam superados os déficits e as crises do ensino no Brasil aí estão os avanços tecnológicos, que têm sido um excelente parceiro nessa tentativa de transmitir conhecimento ao aluno e de fazer com que ele o apreenda. Ferramentas disponibilizadas na internet acabam por manter o aluno mais tempo dedicado aos seus estudos, permitindo que a sua jornada acadêmica se estenda para além daquela exigida em sala de aula. Aliás, o tempo que o aluno permanece na escola é apontado como uma das variáveis que mais explicam o bom desempenho escolar, ao lado da idade de entrada no sistema educacional.
Como vem crescendo o número de docentes que criam sites pessoais e lá incluem discussões, material de apoio, vídeos de reforço do conteúdo ministrado em sala de aula, etc., o computador torna-se, em muitos casos, uma extensão da escola. Além disso, materiais que antes só poderiam ser encontrados em algumas bibliotecas estão disponíveis na internet com acesso livre para todos os interessados, independentemente de sua localização geográfica. É o que ocorre, exemplificativamente, com o portal www.dominiopublico.gov.br, que conta com 57.160 textos, 8.280 imagens, 2.144 sons e 1.138 vídeos.
Uma outra tendência que já faz parte da nossa realidade educacional são cursos ministrados integralmente pela internet. Há também aqueles que aliam internet com aulas telepresenciais. É cada vez maior o número de alunos que cursam uma faculdade ou um curso de pós-graduação por meio da modalidade de ensino a distância.
Isso tem proporcionado a milhares de brasileiros acesso a curso superior ou de pós-graduação, já que, como é sabido, a mensalidade de tais cursos, normalmente, é bem inferior à de um curso presencial. Além disso, há aqueles que não podem se locomover para assistir aula em outra localidade, servindo então, o ensino a distância, como única opção.
O acesso a cursos de formação superior, por sua vez, proporciona um melhor desempenho salarial, além de facilitar a obtenção de emprego (é de 3,8% o índice de desempregados que tenham concluído o ensino superior).
Por tudo isso, já seria de ver com bons olhos o ensino a distância no Brasil. Há, no entanto, algumas preocupações que merecem ser compartilhadas para que, buscando-se superá-las, tal modalidade de ensino venha, de fato, contribuir para a melhoria do nível educacional do país, tema a ser tratado em seguida. Antes, entretanto, de se chegar a tal tema serão trazidas referências quantitativa do ensino a distância no Brasil, a fim de se conhecer a sua extensão, bem como será analisado um dos modelos de ensino a distância - o televirtual - e suas modernas tecnologias de ensino-aprendizagem.
Fonte: Site Folha Dirigida - acesso em 10/11/2008.